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“É insuportável que a economia do futuro cresça como cresceu a economia do passado”

Entrevista | João Pedro Matos Fernandes, Ministro do Ambiente e da Acção Climática |


TPP

João Matos Fernandes deslocou-se em visita oficial a Berlim no passado dia 15 de Dezembro, a convite da sua homóloga alemã, Svenja Schulz, com o objetivo de traçar um ponto de situação conjunto sobre os principais temas na área do ambiente e clima, no contexto da transferência da presidência rotativa do Conselho da União Europeia para Portugal, a partir de 01 de janeiro. Os principais pontos abordados foram: os resultados do Conselho Europeu de Dezembro, a Estratégia Europeia para as Baterias, e o 8º Programa de Ação Ambiental, a Digitalização e a Adaptação.


O PT Post aproveitou a presença do ministro em Berlim para conversar sobre as metas ambientais de Portugal e da União Europeia, especialmente quando se assinalam 5 anos do Acordo de Paris, a relação entre crescimento económico e sustentabilidade e várias políticas de investimento.


PT Post Assinalam-se 5 anos da assinatura do Acordo de Paris. Ainda é um quadro de trabalho que considera suficiente para combater as alterações climáticas? Que impulso poderá dar o regresso da administração norte-americana ao Acordo?


João Matos Fernandes O Acordo de Paris é um acordo verdadeiramente histórico, porque a história de combate às alterações climáticas, antes de Paris, é uma história muito hesitante. Kyoto foi o primeiro passo, mas dizia apenas respeito aos países ditos ricos. Copenhaga foi, no meu entender, um acto falhado, uma encenação em que os países ricos, de forma um bocadinho paternalista, quiseram dizer aos outros o que é que tinham de fazer. Paris é um grande exercício de diplomacia, em primeiro lugar da diplomacia francesa que teve aqui um papel muito importante, e é o acordo verdadeiramente multilateral em que todos se comprometeram a trazer para a mesa das negociações aquilo que tinham. E o que aconteceu, aliás logo a seguir a Paris, foi muito positivo, porque os optimistas achavam que só ao final de quatro anos estaria em vigor e, ao final de um já estava em vigor, podendo Portugal orgulhara-se em ter sido um dos 55 primeiros países que que assinou Paris e que, por isso, se comprometeu com a entrada em vigor do próprio acordo. Paris é um acordo que tem de ser pensado também no longo prazo, isto é, o objectivo é chegar ao final do séc. XXI com a Terra a ter aquecido só 1,5 graus. Já aqueceu 1,1, estamos no mau caminho, sejamos objectivos. Mas, a cada 5 anos, cada uma das partes que subscreveu o acordo tem a obrigação de apresentar uma proposta mais ambiciosa.


É isso que vai acontecer agora e a União Europeia, que lidera, de facto, o combate às alterações climáticas, apresentará uma nova contribuição, com uma meta de redução das emissões em 55% até 2030. Repare, quando há 7/8 anos a UE fixou uma redução de 40% das emissões até 2030, ia caindo o Carmo e a Trindade – isso é impossível, impensável, vamos morrer na penúria se chegarmos lá! E com este objectivo é completamente diferente, afinal os 40% podem ser 55% e vão ser atingidos, quero acreditar que Portugal vai atingir essa meta com toda a serenidade. E, sobretudo, hoje já não há qualquer dicotomia entre a sustentabilidade e o crescimento da economia. Não, a economia vai crescer com o investimento na sustentabilidade. É isso que o roteiro para a neutralidade carbónica prova, é isso que está por trás do European Green Deal, é isso que acontece com a concentração de investimentos - para ser mais rigoroso, 1/3 dos investimentos tem mesmo de ter uma acção directa e positiva no combate às alterações climáticas - que resulta deste esforço europeu para sairmos da crise económica e social provocada pelo Covid

O regresso dos EUA é mesmo bem-vindo. Seria impensável que uma economia com a dimensão que a dos EUA tem e, tão importante quanto isso, pela influência que têm no mundo, que estivesse fora do Acordo de Paris. Por isso fico feliz com a vitória do senhor Joe Biden, por muitas razões, mas uma delas é, sem dúvida, o regresso ao Acordo de Paris. A Europa quer liderar este processo e a Europa fica muito confortada por poder ter também, assim estimamos, na liderança desse processo uma grande democracia, de um grande país que são os EUA


PTP Referia que no passado houve paternalismo das economias mais desenvolvidas e referia que ultrapassamos provavelmente a dicotomia crescimento e sustentabilidade. Isso e mesmo pacifico no seio da própria UE entre o ocidente e o leste europeu? Como se envolver o Leste europeu na estratégia de descarbonização das economias? Como encara a relação entre crescimento económico e sustentabilidade?


JMF Eu mentiria se dissesse que existe um só olhar no quadro da UE. Mas este é o tempo de festejarmos o compromisso que foi alcançado recentemente e que será certamente confirmado com a aprovação em Conselho da nova lei do clima. Neste momento é muito claro que com o apoio particular através do Just Transition Fund – o fundo para a transição justo nos países que estão mais atrasados, e há países que estão mais atrasados: o caso da Polónia é muito evidente –, mas existe, de facto, um compromisso estabelecido em torno dos menos 55%. Não consigo dizer que há uma unanimidade nas posições e ambição, não há! Nesse aspecto, a presidência alemã foi da maior importância ao ter conseguido fazer esta concertação de interesses que não eram completamente convergentes.


Portugal tem aqui um papel muito interessante. Portugal foi o primeiro país do mundo que apostou na neutralidade carbónica em 2050 - fez isso já lá vão quase 3 anos. E junta-se, agora, a Comissão Europeia. O exercício que Portugal fez e que mostrou, nomeadamente aos seus colegas europeus, foi este: depois da assunção da neutralidade carbónica, fizemos um roteiro para a alcançar. Não se fazem projecções a 30 anos, falham todas, mas definimos três cenários para chegar a 2050. E, entre esses três cenários que definimos, aquele em que a convicção que vamos ser neutros em carbono em 2050 é mais robusta, é o cenário em que a economia mais cresce. A economia vai ter de crescer, porque vai haver mais habitantes no planeta.


É insuportável que a economia do futuro cresça como cresceu a economia do passado. A economia do futuro tem de crescer neutra em carbono, tem de crescer regenerando recursos e tem de crescer cabendo dentro dos limites do sistema terrestre. Acho que aí a ciência é muito evidente e unânime, e assim sendo, não devemos perder tempo a discutir que limites são esses: são os que são, já os conhecemos e não os podemos ultrapassar.


PTP Afirma que Portugal tem sido arrojado na definição da sua política de alterações climáticas e sustentabilidade futura. Como se posiciona e qual o papel de Portugal na definição da política europeia de combate às alterações climáticas? Estamos na dianteira da sustentabilidade?


JMF Portugal tem sido um líder, em primeiro lugar, pelo exemplo: 57% da electricidade que consumimos provém de energias renováveis, portanto somos o 5º ou 6º país da Europa onde isso acontece. 14% dos veículos vendidos durante Setembro e Outubro foram eléctricos, o que significa que somos o 4º país da Europa com a maior penetração nesse domínio. E no ano de 2019 o PIB cresceu, com as emissões a reduzir. Eu direi que o ano de 2020 vai ter uma conta muito estranha por causa conta do Covid, vai haver uma grande redução de emissões que não contam, porque vai conseguida pela redução da actividade económica... Mas em 2019 o PIB europeu cresceu 1,5% e o português 2,1% e as emissões da EU reduziram 4,3% enquanto em Portugal reduziram 8,5%. Ou seja, Portugal é um exemplo de um país que consegue crescer mais provocando uma menor quantidade de emissões. Nós conseguimos provocar este divórcio entre duas variáveis que pareciam ter uma correlação directa. E é, sem dúvida, um divórcio feliz: é a prova de que as economias podem crescer afinal tendo menos emissões, porque na história da era moderna só houve menos emissões em períodos de grande crise, o que não foi o caso no ano passado.


PTP Qual o papel, como e que se insere nos objectivos portugueses a estratégia para o hidrogénio?


JMF Quando se fala em descarbonização fala-se essencialmente em electrificação. Temos de ter uma economia, em Portugal, na Europa, e não só, em que fonte de energia utilizada seja cada vez mais a electricidade, mas electricidade produzida a partir de fontes renováveis. Portugal tem a sorte de ter vento, água e sol para produzir 100% da electricidade que consome a partir de fontes renováveis. E no investimento que estamos a fazer, na água será cada vez menor dada a escassez: não vamos construir mais barragens para produzir electricidade do que aquelas que já estão em curso no Alto Tâmega; nos nossos próprios cenários para 2050, a partir de 2030, a água vai até ter uma quota cada vez menor. Mas vento, com o que existe já hoje e com as melhorias tecnológicas que existem vamos conseguir, sem termos de construir mais fustes e torres eólicas, reforçar a nossa capacidade de produção. Com a eólica em off shore e, sobretudo, com o sol. Portugal ainda é hoje um menino na produção de electricidade a partir de fonte solar, temos pouco mais do que 1Megawatt. Foi a grande aposta que fizemos nos últimos 2 anos com leilões que correram muitíssimo bem: batemos recordes mundiais de preço baixo na produção de electricidade a partir de fonte solar.


Hoje já não há qualquer dicotomia entre a sustentabilidade e o crescimento da economia. A economia vai crescer com o investimento na sustentabilidade.

Mas, se a grande aposta é a electrificação, descarbonização e electrificação não são sinónimos. Há processos que precisarão sempre de gases pela sua intensidade energética, nomeadamente processos industriais ou o transporte pesado – o transporte ligeiro pode funcionar todo a baterias. No transporte pesado, para ter um camião com autonomia de 500km, as baterias que leva pesam tanto que fazem com que uma parte muita expressiva da energia consumida seja para transportar as próprias baterias e não a carga, o que é obviamente um contrassenso. Se temos de continuar a usar gases é fundamental que esses gases sejam renováveis. Para Portugal é fundamental que esses gases sejam renováveis por duas ordens de razão: primeira, pelo nosso compromisso em sede de redução de emissões, claro, e, segunda, porque não temos gás natural e nem vamos querer ter. E aqui o hidrogénio é de facto o gás mais interessante para ser produzido como gás renovável, repare que quando se fala de estratégia para o hidrogénio, e quando a Europa fala de estratégia para o hidrogénio, Portugal diz sempre hidrogénio verde, isto é hidrogénio produzido a partir da água e utilizando como electricidade sempre fontes renováveis, muito particularmente a solar onde o preço é muito interessante. 70% do preço da produção de hidrogénio é energia consumida na separação da molécula H2O em H2 e em O, que também é O2. Assim sendo, é fundamental que tenhamos gases renováveis para esses outros processos, e não só hidrogénio: estou a pensar também no biometano. Portugal, na legislação que tinha e que alterámos há menos de meio ano, estava proibido injectar gases renováveis na rede, não havia regulamentação para tal, o que era obviamente um absurdo. E há um caso concreto que demonstra esse absurdo: o biometano é produzido, por exemplo, abundantemente nos aterros: um aterro selado contém matéria orgânica, produz biometano. Nos aterros em Trás-os-Montes esse biometano estava a ser utilizado como combustível nos camiões que fazem os circuitos de recolha; mas não podia ser injectado na rede, o que era um contrassenso, e agora já pode. Os gases renováveis não serão só o hidrogénio, mas o hidrogénio vai ter uma quota-parte muito grande entre eles.

PTP Que esperar dos novos mecanismos de apoio financeiro europeus na implementação de políticas de combate às alterações climáticas e promoção de políticas de sustentabilidade? Que projectos espera tornar viáveis com este apoio financeiro?


JMF A expansão da rede de transporte colectivo nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, fazendo chegar transportes mais pesados do que o autocarro também a cidades como Braga e Guimarães: sistemas de BRT – metrobus, que são veículos eléctricos entre o autocarro e o light rail (metro ligeiro) que funcionam em circuitos fechados, mas funcionam com pneu. O investimento na eficiência energética dos edifícios públicos e privados. A descarbonização da indústria: uma parcela muito significativa da primeira versão do PRR – Programa de Recuperação e Resiliência – é a descarbonização da indústria, com mais de 700 milhões de euros, e será gerida pelo meu colega da Economia. A bioeconomia, em que temos três projectos muito interessantes e pioneiros para a produção de bens de consumo a partir de produtos de base natural no têxtil, calçado e resina – 150 milhões de euros para estes três grandes projectos. E, enfim, todas as outras áreas das infraestruturas em que Portugal ainda está carente: nós temos de reduzir muito os resíduos que enviamos para aterro, portanto, temos de separar cada vez mais a matéria orgânica que pode mesmo ser não resíduo, mas um recurso.


Há uma outra área que também é muito importante: a adaptação climática. Portugal é dos países que sabe que esta questão das alterações climáticas não é um problema para as gerações do futuro, é mesmo um problema para o presente. Veja-se os incêndios de 2017, os 13 km2 de costa que o país já perdeu por causa do avanço do mar, a seca a sul do rio Tejo que já não é um fenómeno conjuntural, é estrutural. Portanto, nós temos mesmo de adaptar o nosso território e o que fazemos do nosso território a esta nova realidade climática. E para isso, precisamos de investir na protecção da linha de costa, no combate à desertificação, na reabilitação de rios e ribeiras – porque haver seca não quer dizer que o risco de cheia esteja reduzido; quando chove, parece que a chuva vem toda de uma vez. São projectos que vão ser financiados através dos fundos existentes no PRR e também no próximo quadro comunitário de apoio.


PTP Embora seja primariamente uma área de responsabilidade de outros colegas de governo seus, como encara o papel da ferrovia como contributo para a sustentabilidade? Há planos para uma ligação a sério de Portugal ao resto da Europa e para garantir a coesão nacional?


JMF A ferrovia é fundamental para a descarbonização e Portugal é um país que tendo hoje uma rede rodoviária muito robusta, se calhar, no seu tempo, pôs demasiados ovos num só cesto, que foi o cesto do alcatrão. Por isso, está a investir hoje na ferrovia como não há memória, se calhar, desde que os ingleses andaram a fazer comboios em Portugal no tempo da regeneração e do fontismo. Mas a ideia da rede europeia é, sobretudo, uma ideia para mercadoria e, por isso, o investimento na recuperação e profunda renovação da linha da Beira Alta, a ligação Porto-Vigo e a nova linha que esta em construção de Sines a Madrid: são absolutamente essenciais para o transporte de mercadorias.


A periferia geográfica de Portugal relativamente ao centro da Europa impossibilitará sempre a possibilidade da utilização do comboio, só mesmo muito marginalmente, para ligação de passageiros. Por isso esta aposta que o governo irá fazer para ter uma ligação rápida entre Lisboa e Porto. As ligações de alta velocidade não têm de ser necessariamente integradas numa rede, desde que haja dois polos que justifiquem pelo volume de tráfico que geram: essas ligações devem ser feitas. E essa ligação é fundamental para promover a descarbonização da ligação Lisboa-Porto, retirando muitos automóveis da autoestrada, mas também porque eu não sei dizer quantos anos faltam, mas podemos contar os anos que faltam para que na UE as distâncias com menos de 500 km não possam ser feitas por modo aéreo.

PTP Referindo o transporte aéreo e especialmente face a experiência deste ano, continua a ver o Montijo como instrumental para o país. Sente-se confortável com o relatório a avaliação de impacto ambiental ao desenvolvimento do aeroporto do Montijo para receber aviação comercial? Como acompanha e reage às críticas, nacionais e internacionais, concernentes à preservação do habitat de aves migratórias e da biodiversidade única do estuário do Tejo?


JMF O relatório de avaliação de impacto ambiental é um relatório técnico e eu não tenho um olhar que diga que está muito bem quando a administração concorda comigo, e que está muito mal quando a administração discorda de mim: sei de outros partidos que fazem assim, mas não é nem o caso do meu partido, nem o meu. A solução Montijo é uma solução que veio do governo Passos Coelho na perspectiva de Portela +1. Se me pergunta sobre se a solução é Portela +1, essa é uma questão que tem de colocar ao Primeiro-ministro ou ao Ministro das Infraestruturas. Dentro da solução Portela + 1 eu não encontro sítio melhor o aeroporto complementar do que o Montijo. Primeiro, o aeroporto que causa menos impactos ambientais é o aeroporto que já esta feito. Repare, nós só andamos aqui a discutir dois impactos ambientais: avifauna e ruído, não falamos de mais nada, porque já existe. Se pensar em Alcochete, é uma frente urbana a 40-50 km da área metropolitana de Lisboa, requer destruir 3.000 hectares de terreno, mais de 1.000 dos quais são montados de sobro, é destruir uma barragem para a rega do arroz, é obrigar a deslocações, para lá e para cá, que geram emissões muito maiores. E, portanto, não estou aqui a fazer nenhuma comparação fora deste cenário Portela +1. E dentro deste cenário, eu continuo a achar que o Montijo é a melhor opção para o +1.


PTP Teme que as nossas metas ambientas estejam a ser atingidas muito à custa do agravamento de taxas e impostos, nomeadamente da taxa de carbono?


JMF A taxa de carbono é absolutamente essencial para que se internalizem os verdadeiros custos associados àquilo que é, por exemplo, a produção de electricidade na economia. Não é só. Eu ouvi e li muitos artigos e a conta nem estaria necessariamente errada sobre aquilo que foi, ao tempo, e não se revelou o caso, o sobrecusto resultante da aposta nas fontes renováveis para a produção de electricidade. Mas ouvi muito pouca gente a falar, por exemplo, nos 600 milhões de euros que Portugal perdia por ano com subsídios perversos, que significavam a não cobrança de imposto à produção de electricidade a partir do carvão, do petróleo e do gás: sobre isso, parece que ninguém fala. É, portanto, fundamental que acabem esses subsídios perversos. Dou-lhe um exemplo. Bastou que o carvão, e obviamente que não se passa de 0% para 100% de um ano para o outro, mas o carvão passou a pagar 10, 25, 50%: chegou aos 50% e o que é que vai acontecer? As duas centrais de carvão vão fechar para o ano. E porquê? Porque é muito mais barato produzir electricidade a partir de fontes renováveis se tudo for justo a nível de impostos, do que produzi-la a partir de fontes fósseis. Por isso, a taxa de carbono é essencial para criar justiça, não é para agravar nada, é porque há uma pegada ambiental associada ao uso dos combustíveis fosseis que não estava dentro do mercado e que tem de passar para dentro do mercado. E só passa se houver uma taxa de carbono que permita fazer essa internalização de custos. A taxa de carbono em Portugal está associada ao valor da venda em leilão da tonelada de CO2, que neste momento anda por volta dos 25 euros; para ter uma ideia, na altura do Acordo de Paris andava nos 8/9 euros. E o Sr. Steglitz, que é quem é, acha que se a taxa for inferior a 65 euros não há justiça, continuam os senhores dos combustíveis fósseis a ter uma posição muito mais privilegiada do que os outros.


Portugal é um exemplo de um país que consegue crescer mais provocando uma menor quantidade de emissões.

PTP Porque é que foi necessária uma coligação negativa no parlamento para garantir uma dotação orçamental significativa para a recuperação e reflorestação do Pinhal de Leiria e de matas com gestão nacional?


JMF Não, vamos lá ver: a nova política florestal deste governo, e já foi sob responsabilidade minha, foi uma das principais razões para termos dado um salto de oito lugares no ranking dos países mais comprometidos com as alterações climáticas. Nós sabemos mesmo bem o que temos de fazer nas florestas. O Tolstoi dizia que há quem passeie no bosque e só veja lenha para a fogueira. Não é, de todo em todo, essa a perspectiva que nós temos! Uma árvore deve ser vista sobretudo pela copa e não pelo tronco, porque é na copa que é feita a fotossíntese e em que é feito o sumidouro de carbono. E uma floresta é muito mais que um somatório de árvores, é o ecossistema onde a grande parcela da biodiversidade em Portugal existe e que é responsável pelo ar puro que respiramos, pela água pura que bebemos. Por isso, é fundamental o investimento na floresta reconhecendo este mesmo bem público


A coligação negativa de que me fala é uma coligação negativa que, com todo o respeito, não transforma em nada aquilo que estamos a fazer. Ainda bem que faz esta pergunta porque, há bocado, quando elenquei as diversas áreas de investimento do PRR, esqueci-me de uma, que ainda por cima não é detalhe nenhum: são 750 milhões de euros para a floresta, com investimentos especialmente na alteração da própria paisagem, isto é, no refazer o mosaico paisagístico que existia quando Portugal tinha muito menos floresta e ela não ardia; portanto, para combater, claramente, as manchas de monocultura. A nossa meta é chegarmos a 2030 com a área ardida reduzida para metade. Isto é atacar principalmente os grandes incêndios. Portugal vai ter sempre incêndios, isso não temos como combater face ao nosso clima mediterrânico. Agora, os grandes incêndios combatem-se, sobretudo, se não houver grandes uniformidades de paisagem de monocultura, e é isso mesmo que temos de fazer e que vamos fazer.


Para a recuperação das matas nacionais estão previstos, salvo erro, 15 milhões de euros. Estarei até em Leiria, no início do ano, para apresentar o nosso projecto para o pinhal. Vamos lá ver, eu percebo muito bem a frustração das pessoas quanto ao pinhal de Leiria, estamos a falar de terem ardido milhares de hectares de pinheiros com mais de 80 anos. Agora, nós tivemos de esperar os três anos necessários para a regeneração natural, já interviemos em cerca de 3.000 hectares e queremos chegar aos 5.000 hectares em dois anos. Com certeza, muitos anos se passarão até que o pinhal de Leiria volte a corresponder à memória que nos próprios tínhamos daquele pinhal.


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